Fonte:
O Estado de S.Paulo
O
consumidor brasileiro sente-se reconfortado ao constatar pela mídia que as
petrolíferas dos EUA e de outros países repassam diretamente para os preços da
gasolina a alta do petróleo no mercado internacional. No Brasil, isso não é
assim, e os preços dos combustíveis deveriam permanecer estáveis até uma
decisão oficial autorizando o seu reajuste, o que as autoridades asseguram que
não vão fazer em face da volatilidade das cotações internacionais e por causa
das consequências inflacionárias. Acontece que o preço do etanol vem disparando
nos postos, com reflexos sobre o da gasolina. Nas últimas quatro semanas, o
preço do álcool vendido pelos produtores aos distribuidores teve um aumento de
20,5%, que tem sido repassado, em proporções variáveis, de município para
município e até de posto para posto, ao consumidor. Como o álcool anidro deve
ser adicionado à gasolina na proporção de 25%, um bom número de distribuidores
tomou a iniciativa de também elevar o preço do derivado de petróleo. Na
entressafra da cana de 2010, o governo, para evitar essa contaminação,
concordou em reduzir o porcentual de adição para 20%, de fevereiro até maio. E
a mesma solução oportunista volta a ser cogitada. A um mês da entrada da nova
safra de cana, a Federação Nacional do Comércio de Combustíveis
(Fecombustíveis) anunciou que vai solicitar à Agência Nacional do Petróleo a
diminuição, para 10%, do porcentual de adição de álcool à gasolina, 15 pontos
porcentuais a menos do que o nível atual, sob a justificativa de que pode
faltar etanol nos postos.
Uma
coisa é o álcool hidratado ter deixado de ser competitivo com a gasolina, pois,
para isso, ele deve custar, nos postos, no máximo até 70% do preço da gasolina.
Coisa diferente é o porcentual de adição de álcool anidro à gasolina, que, se
fosse diminuído, na forma proposta, causaria uma elevação maior do preço da
gasolina, uma vez que o etanol ainda custa menos. Além disso, uma medida dessa
ordem abriria muito mais espaço para o avanço do consumo de gasolina, que
cresceu 17,5% no ano passado em comparação com 2009 e deve continuar em
ascensão com a expansão da frota nacional de veículos, incluindo os importados,
que não têm motores bicombustíveis (flex).
O
fato é que a produção de etanol no Brasil ainda obedece a um padrão cíclico.
Quando as cotações do açúcar estão em alta, como agora se verifica, as usinas
preferem produzir mais o produto, em detrimento do etanol. Daí advém a crise na
oferta de álcool hidratado na entressafra. Na safra de 2009/2010, o motivo
alegado foi a seca e, segundo afirmam os usineiros, os efeitos da quebra de
safra anterior repercutiram também em 2010/2011, atrasando a produção. De
qualquer forma, a expectativa é de que a produção nacional de etanol hidratado
em 2011 fique entre 15 bilhões e 16 bilhões de litros, volume semelhante ao do
ano anterior. A isso, deve-se somar 23 bilhões de litros, aproximadamente, de
álcool anidro, se não for alterada a porcentagem de adição à gasolina.
Para
quebrar o dilema entre a produção de açúcar e de etanol, de modo a atender
plenamente à demanda interna do biocombustível e poder exportá-lo regularmente
em quantidades significativas, só há uma saída: a formação de estoques
reguladores, calculados em 5 bilhões de litros de etanol. Há financiamento do
Banco do Brasil para isso, mas os produtores se queixam de que o acesso é
difícil, seja por problemas de cumprimento da legislação trabalhista, seja pela
exigência de garantias. Precisaria haver também um mecanismo confiável de
controle dos estoques.
A
situação hoje é crítica, mas o setor sucroalcooleiro está em transformação. Até
três anos atrás, poucas agroindústrias funcionavam exclusivamente como
destilarias de etanol. Hoje, há várias unidades desse tipo e os investimentos
mais recentes encaminham-se mais nessa direção, com a ênfase crescente, no
mundo, à produção de biocombustíveis. Somente com uma expansão em grande escala
da produção brasileira, com ganhos apreciáveis de produtividade, o etanol poderia
se transformar em uma commodity internacional, como se aspira.
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