domingo, 16 de agosto de 2015

REDAÇÃO DISSERTATIVA-O PREÇO DO ÁLCOOL

Fonte: O Estado de S.Paulo

O consumidor brasileiro sente-se reconfortado ao constatar pela mídia que as petrolíferas dos EUA e de outros países repassam diretamente para os preços da gasolina a alta do petróleo no mercado internacional. No Brasil, isso não é assim, e os preços dos combustíveis deveriam permanecer estáveis até uma decisão oficial autorizando o seu reajuste, o que as autoridades asseguram que não vão fazer em face da volatilidade das cotações internacionais e por causa das consequências inflacionárias. Acontece que o preço do etanol vem disparando nos postos, com reflexos sobre o da gasolina. Nas últimas quatro semanas, o preço do álcool vendido pelos produtores aos distribuidores teve um aumento de 20,5%, que tem sido repassado, em proporções variáveis, de município para município e até de posto para posto, ao consumidor. Como o álcool anidro deve ser adicionado à gasolina na proporção de 25%, um bom número de distribuidores tomou a iniciativa de também elevar o preço do derivado de petróleo. Na entressafra da cana de 2010, o governo, para evitar essa contaminação, concordou em reduzir o porcentual de adição para 20%, de fevereiro até maio. E a mesma solução oportunista volta a ser cogitada. A um mês da entrada da nova safra de cana, a Federação Nacional do Comércio de Combustíveis (Fecombustíveis) anunciou que vai solicitar à Agência Nacional do Petróleo a diminuição, para 10%, do porcentual de adição de álcool à gasolina, 15 pontos porcentuais a menos do que o nível atual, sob a justificativa de que pode faltar etanol nos postos.
Uma coisa é o álcool hidratado ter deixado de ser competitivo com a gasolina, pois, para isso, ele deve custar, nos postos, no máximo até 70% do preço da gasolina. Coisa diferente é o porcentual de adição de álcool anidro à gasolina, que, se fosse diminuído, na forma proposta, causaria uma elevação maior do preço da gasolina, uma vez que o etanol ainda custa menos. Além disso, uma medida dessa ordem abriria muito mais espaço para o avanço do consumo de gasolina, que cresceu 17,5% no ano passado em comparação com 2009 e deve continuar em ascensão com a expansão da frota nacional de veículos, incluindo os importados, que não têm motores bicombustíveis (flex).
O fato é que a produção de etanol no Brasil ainda obedece a um padrão cíclico. Quando as cotações do açúcar estão em alta, como agora se verifica, as usinas preferem produzir mais o produto, em detrimento do etanol. Daí advém a crise na oferta de álcool hidratado na entressafra. Na safra de 2009/2010, o motivo alegado foi a seca e, segundo afirmam os usineiros, os efeitos da quebra de safra anterior repercutiram também em 2010/2011, atrasando a produção. De qualquer forma, a expectativa é de que a produção nacional de etanol hidratado em 2011 fique entre 15 bilhões e 16 bilhões de litros, volume semelhante ao do ano anterior. A isso, deve-se somar 23 bilhões de litros, aproximadamente, de álcool anidro, se não for alterada a porcentagem de adição à gasolina.
Para quebrar o dilema entre a produção de açúcar e de etanol, de modo a atender plenamente à demanda interna do biocombustível e poder exportá-lo regularmente em quantidades significativas, só há uma saída: a formação de estoques reguladores, calculados em 5 bilhões de litros de etanol. Há financiamento do Banco do Brasil para isso, mas os produtores se queixam de que o acesso é difícil, seja por problemas de cumprimento da legislação trabalhista, seja pela exigência de garantias. Precisaria haver também um mecanismo confiável de controle dos estoques.

A situação hoje é crítica, mas o setor sucroalcooleiro está em transformação. Até três anos atrás, poucas agroindústrias funcionavam exclusivamente como destilarias de etanol. Hoje, há várias unidades desse tipo e os investimentos mais recentes encaminham-se mais nessa direção, com a ênfase crescente, no mundo, à produção de biocombustíveis. Somente com uma expansão em grande escala da produção brasileira, com ganhos apreciáveis de produtividade, o etanol poderia se transformar em uma commodity internacional, como se aspira.

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