Já
pensou em alugar o quarto vazio da sua casa para um turista? Almoçar na casa de
um estranho que cozinhe para você ou compartilhar um escritório por algumas
horas com outras pessoas? Ou compartilhar um serviço de transporte?
Serviços
como o polêmico Uber, que pode conectar diversos passageiros a um
motorista particular, CouchSurfing, que hospeda pessoas em residências, ou o
Airbnb, aplicativo que permite às pessoas alugarem sua própria casa para
turistas, fazem parte da economia compartilhada, também conhecida como economia
colaborativa.
Trata-se
de um novo jeito de consumir e de um novo modelo econômico com negócios ligados
à prática do compartilhamento. O consumidor não adquire a posse dos bens, mas o
seu acesso. Isso porque a ideia é dividir, alugar ou partilhar o uso de
produtos e serviços com os outros.
A
partir desse modelo, pessoas físicas podem ter relações diretas de compra e
venda de qualquer tipo de demanda. Uma das consequências é a descentralização
do fluxo entre clientes e empresas, evitando o papel de intermediários e
aproximando consumidores e fornecedores.
O
motor principal dessa economia é a tecnologia digital. Surgida na década de
1990, as primeiras plataformas online de venda de produtos pela internet
começaram a abrir o caminho para a economia compartilhada, como o site eBay,
que vende produtos usados, e a Craiglists, página de classificados.
Tecnologia
impulsiona
Atualmente,
a maior parte dos serviços compartilhados é oferecida por sites e aplicativos
para smartphones. A plataforma é intermediária da operação entre um usuário e o
fornecedor e ganha uma porcentagem sobre o negócio. E com a internet, a
colaboração pode acontecer em escala global.
As
vantagens para o consumidor são muitas. Ele pode gastar pouco por algo que só
usaria por um tempo curto e com um acesso menos burocrático. Pode ainda reduzir
o impacto ambiental e ter uma relação mais próxima com a pessoa que está
compartilhando. Mas há uma questão importante: como confiar na pessoa que
presta um serviço?
Dois
pontos comuns nos sites de compartilhamento são a confiança e a reputação,
consideradas como “novas moedas” neste universo. Nas plataformas virtuais,
usuários prestadores do serviço são avaliados uns pelos outros; os que recebem
boas avaliações conseguem fazer mais conexões, lucram mais e tendem a alavancar
a qualidade dos serviços.
A
previsão é de que a economia compartilhada movimente bilhões nos próximos anos.
Hoje, por exemplo, o valor de mercado da plataforma Airbnb é calculado em US$
13 bilhões. A consultoria multinacional PricewaterhouseCoopers prevê que o
setor movimente em 2025, no mundo todo, algo em torno de US$ 335 bilhões.
Segundo uma pesquisa realizada pela consultoria Nielsen, em 2013, 70% das
pessoas na América Latina estariam dispostas a participar de serviços de
compartilhamento, contra 52% na América do Norte.
A
aplicação desse modelo em negócios é infinita. Nos Estados Unidos e na Europa
já existe o crowdbanking, aplicativo para smartphone em que as pessoas
emprestam dinheiro para outras a uma taxa equivalente à metade da cobrada pelos
bancos.
O
Brasil também tem start ups que trabalham no modelo colaborativo. Um exemplo é
a Cabe na Mala, que conecta pessoas interessadas em produtos do exterior a
viajantes que se colocam à disposição para trazê-los em troca de uma
recompensa. Já o site descolaai.com convida as pessoas a “trocar, comprar,
vender, ensinar e aprender” com amigos e comunidades.
Ao
propor nova dinâmica dos negócios, as empresas da economia compartilhada
incomodam setores tradicionais e a economia formal, pois, ao oferecer custos
reduzidos e menos burocracia, esse modelo de negócios pode impactar na demanda
dos consumidores pelas antigas empresas.
O
setor hoteleiro é um exemplo de impacto significativo. Em Nova York já são 1 milhão
de hospedagens disponíveis no AirbnB. No Rio de Janeiro, o Airbnb já conta com
cerca de 80 mil leitos, o equivalente a quase a mesma capacidade da rede
hoteleira tradicional.
Na
capital carioca, a Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH) tenta
convencer a prefeitura de que o serviço pode prejudicar a cidade, já que não se
tem cobrança de ISS (Imposto sobre Serviços).
A
maior polêmica sobre o tema no Brasil envolve o Uber, plataforma de tecnologia
que conecta passageiros a motoristas particulares que cobram para fazer
corridas. Usuários dizem que o serviço é mais barato e oferece maior conforto
do que os táxis tradicionais.
Uber
virou notícia
O
Uber está presente em 58 países e chegou ao Brasil em 2014. Temendo a
concorrência com o aplicativo, motoristas de táxis de diversas cidades como São
Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ) e Belo Horizonte (MG) começaram a protestar
contra seu uso.
Em
agosto a situação virou caso de polícia. Em São Paulo, um motorista do Uber foi
sequestrado e agredido por um grupo de taxistas. Em Brasília, taxistas atacaram
carros de luxo que foram confundidos com veículos do Uber.
Os
taxistas defendem que o app atua de forma irregular e argumentam que transporte
privado de passageiros só pode ser feito por táxis, além de reclamarem que a
empresa dona do aplicativo não paga impostos obrigatórios como os taxistas.
O
Estado brasileiro considera o Uber como um serviço ilegal. A legislação prevê
que o transporte de passageiros remunerado deve ser feito apenas com a
autorização do Governo.
O
Uber driblou o problema ao conectar os passageiros apenas com motoristas
profissionais, que possuem o próprio carro regulamentado ou que trabalham para
empresas de transporte. O Departamento de Transportes Públicos (DTP) da
Secretaria Municipal de Transportes (SMT) de São Paulo entende que o aplicativo
se enquadra como um serviço clandestino de táxi.
Uma
solução para o conflito seria a aprovação do serviço pelas prefeituras. Em
muitas cidades do mundo a plataforma já é aceita. Em agosto, Londres reconheceu
a legalidade do serviço.
Em
Brasília, o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg vetou um
projeto de lei aprovado na Câmara Legislativa que pretendia proibir a empresa
de atuar na capital federal. No entanto, o veto não regulariza o aplicativo.
Até que haja uma regulamentação dos serviços, apenas os motoristas autorizados
pelo Estado a realizar transportes de pessoas poderão funcionar legalmente.
Leis
e impostos: ainda um problema
Um
das maiores críticas às empresas da economia compartilhada é que elas
proporcionam uma competição desleal a empresas tradicionais por não pagarem os
mesmos impostos.
Além
da falta de arrecadação de tributos, o Estado teme que no futuro, serviços como
o Uber possam impactar o mercado de trabalho e trazer desemprego a diversas
categorias.
Os
serviços de compartilhamento não possuem contrato de vínculos empregatícios e
não são enquadrados em regulações da legislação trabalhista.
Outra
questão é falta de recursos que proteja a relação de compra e venda no Código
de Defesa do Consumidor, que não regula atividades entre pessoas físicas.
Produtos
com defeitos, informação falsa e falta de contrato podem ser alguns dos riscos.
O Airbnb, por exemplo, recebeu avaliações de alguns usuários que denunciaram
abuso por parte de locatórios.
Essa
falta de regulação pode colaborar para relações desiguais entre cliente e o
fornecedor ou deixar o trabalhador mais vulnerável e com menor renda,
resultando na precarização do serviço.
Com
o crescimento na oferta desses serviços, a tendência é que surjam novos tipos
de regulação para que negócios tradicionais e o compartilhados possam conviver.
Mas o fato é que essa nova economia veio para ficar e este modelo deve ser cada
vez mais comum.
BIBLIOGRAFIA
O
que É Meu É Seu – Como o Consumo Colaborativo Vai Mudar o Nosso Mundo, de
Rachel Botsman e Roo Rogers (Bookman, 2011)
Carolina
Cunha
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